6 de mar. de 2012

GamerArt - A hora e a vez dos 'indie games'


Com faturamento anual de 90 bilhões de dólares, mercado independente de jogos eletrônicos cresce no mundo e garante espaço para títulos 'cabeça'

Renata Honorato
Game independente 'Limbo' faz referência ao cinema expressionista alemão
Game independente 'Limbo' faz referência ao cinema expressionista alemão (Marcos Michael)
A Game Developers Conference (GDC), que acontece nesta semana, em São Francisco, nos Estados Unidos, é famosa por reunir desenvolvedores de jogos ligados a gigantes do setor de entretenimento digital e também profissionais do mercado independente.
Ao longo de cinco dias, programadores e designers de games trocam experiências através de painéis e mostram versões de jogos beta que serão lançados nos próximos meses. Considerado o evento mais importante do mundo para a comunidade de desenvolvimento, a GDC aponta tendências para os anos que virão. Não é de se estranhar, portanto, que a quantidade de representantes independentes tenha crescido exponencialmente nos últimos anos, tendo em vista a boa entrada que os títulos alternativos têm registrado no mercado.
Esses jogos não têm por trás grandes produtoras, não estão presentes nas grandes feiras do mundo e não contam com celebridades para promovê-los, mas faturam milhões graças às novas plataformas de distribuição on-line. É o caso de Minecraft, que já foi baixado por mais de 5 milhões de pessoas. O preço médio do título, que varia de gadget para gadget, é de 20 dólares. As estatísticas levam a crer que o jogo tenha faturado ao menos 100 milhões de dólares.  
Minecraft foi desenvolvido pelo sueco Markus "Notch" Persson e lançado oficialmente em novembro de 2011. Nele, o jogador constrói cenários a partir de blocos tridimensionais a fim de criar um ambiente propício à vida. Atualmente, o jogo está disponível nos sistemas iOS, da Apple (Mac, iPhone, iPod, iPad); Android, do Google; e PC. Neste ano, Minecraft chega também à PSN, a rede on-line do PlayStation 3 (Sony), e à Xbox Live, a rede on-line do Xbox 360 (Micropsoft).  
A exemplo do que ocorre no cinema independente, é no setor de jogos alternativos, conhecidos como indie games, que surgem os títulos mais ousados e mais repletos de referências. Como não há uma distribuidora por trás dos desenvolvedores criando padrões ou impondo regras, os designers se sentem livres para adequar seus projetos às suas preferências. Daí, surgem os "jogos cabeça", uma curiosa analogia ao cinema cult (os "filmes cabeça"), que, embora retratem assuntos complexos ou façam referência a artes plásticas, literatura e música, encontram seu público. 

Seis 'jogos cabeça' aclamados pela crítica
1-'The Cat That Got the Milk', inspirado em Kandinsky, Miró e Mondrian



O jogo independente The Cat That Got the Milk foi produzido na Inglaterra por funcionários de um estúdio de desenvolvimento de games local. O título conta a história dos gatos que saem à noite para enfrentar aventuras nas ruas de uma cidade fictícia, cuja estética lembra os traços de artistas como Wassily Kandinsky, Joan Miró, Mark Rothko e Piet Mondrian. A trilha sonora do jogo foi composta em estilo minimalista e foi inspirada na obra de Steve Reich, músico nova-iorquino pioneiro do gênero. O game oferece entretenimento por, aproximadamente, 15 minutos. Segundo Helana Santos, brasileira radicada em Londres e uma das envolvidas no projeto, o tempo é um recurso valioso. "Eu adoro jogos, mas não tenho como me dedicar a eles porque exigem muito da gente. Essa foi a razão pela qual decidimos criar um game curto", diz. The Cat That Got the Milk é gratuito e pode ser baixado no site oficial do jogo.  
Preço: Grátis

2-'Xilo', inspirado em xilogravura e literatura de cordel


Xilo é um jogo brasileiro ainda em desenvolvimento. Ele está sendo produzido por uma equipe de Campina Grande, na Paraíba, e deve ser lançado durante as festas de São João, em junho. O game foi inspirado na xilogravura, uma técnica artística muito comum no Nordeste. Também traz elementos de literatura de cordel e trilha sonora composta pela banda Cabruêra, conhecida na região por misturar música eletrônica e baião. A trama acontece em torno de Biliu - homenagem ao músico Biliu de Campina, forrozeiro popular na Paraíba -, que ao chegar em casa percebe que sua família está doente. Ele descobre, então, que precisa resgatar pedaços de xilogravura para fazer com que todo mundo seja curado. Na ocasião de seu lançamento, o jogo chegará ao mercado nas versões para computador (PC e Mac), iOS (iPhone e iPad) e Xbox Live.  Segundo Rodrigo Motta, integrante da equipe que conta com 11 pessoas, o game é como um sonho que está se tornando realidade. "Crescemos com a literatura de cordel e com o baião. Sempre pensamos em registrar essas histórias e personagens de alguma forma. O jogo foi produzido para isso", diz. Xilo foi um dos vencedores do SBGames 2011, simpósio anual que avalia projetos na área de desenvolvimento e organiza workshops e palestras para a comunidade de jogadores no Brasil.  

3-'Toren', inspirado em Hayao Miyazaki ('A Viagem de Chihiro')


Toren ainda não foi lançado, mas já tem uma trajetória de prestígio. O jogo, desenvolvido em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, recebeu menção honrosa do Festival Internacional de Games Independentes (IGF, na sigla em inglês), um dos eventos mais importantes do setor em todo o mundo. O jogo conta a história de uma princesa presa na torre de um castelo que espera ser salva por um cavalheiro. O que difere Toren dos outros jogos, contudo, é que a trama se desenrola a partir da perspectiva da princesa, que sofre um encantamento e passa por todas as fases de sua vida (infância, adolescência e maturidade) enquanto permanece enclausurada. A grande inspiração da equipe, conta Alessandro Carlos Martinello, diretor de arte no projeto, é a obra do artista japonês Hayao Miyazaki, conhecido no Brasil por suas animações A Viagem de Chihiro e O Castelo Animado. Por ora, a equipe desenvolve o título durante o tempo livre, mas os quatro integrantes do grupo pretendem transformar o projeto paralelo em suas atividades principais em breve. Segundo Martinello, eles já receberam propostas de investimento dos Estados Unidos e de distribuidoras internacionais. A expectativa é queToren seja lançado para PC, Mac, PSN e Xbox Live em 2013.

4- 'The Bridge', inspirado em Escher


O quebra-cabeça The Bridge foi desenvolvido pelos americanos Ty Taylor, engenheiro da Microsoft, e Mario Castaneda, estudante da Universidade de Tecnologias Avançadas, no Arizona. Inspirado em M. C. Escher, o título força o jogador a reavaliar os conceitos da física e perspectiva, manipulando a gravidade para redefinir tetos e pisos através de arquiteturas complexas. A arte do game é baseada em desenhos em preto e branco, feitos à mão, no estilo da litografia. A versão de demonstração do jogo chegou a ser disponibilizada na rede, mas sua distribuição foi interrompida até o lançamento oficial, ainda sem data definida. O processo de desenvolvimento do jogo teve início em 2010 e, desde então, o título foi destaque nos dois principais festivais internacionais do gênero: o IndieCade e o Festival Internacional de Jogos Independentes.

5-'Braid', inspirado no livro As Cidades Invisíveis, de Italo Calvino


Braid é um aclamado jogo independente desenvolvido por Jonathan Blow. O game permite a manipulação do tempo em cenários diversos, que variam de mundo para mundo. O jogador pode, por exemplo, executar uma ação e, caso se arrependa de um golpe ou de um movimento, tem a chance de voltar no tempo para consertar o erro. Ele pode também ir para o futuro para descobrir se a jogada será interessante diante de sua estratégia. A história de Braid é baseada no protagonista Tim, que precisa resgatar uma princesa de um monstro. O jogo é divido em seis mundos muito peculiares, inspirados nas cidades criadas por Italo Calvino, na obra As Cidades Invisíveis. As canções que compõem a trilha sonora de Braid foram compostas pelos músicos Cheryl Ann Fulton, Shira Kammen e Jami Sieber e foram licenciadas junto ao selo independente Magnatune. Desde 2008, quando foi lançado, o game foi premiado por diversas instituições. O mais importante foi o título de "Jogo do Ano" recebido durante a 12º edição do Academy of Interactive Arts & Sciences Awards (AIAS), em 2009. O jogo está disponível nas plataformas Xbox 360, Windows, Mac OS X, Linux e PlayStation 3. 
Preço: 3,75 dólares
   

6-'Limbo', inspirado no expressionismo alemão


Limbo foi desenvolvido pelo estúdio independente Playdead, na Dinamarca, e ganhou destaque no mercado mesmo sem a ajuda de um distribuidor de peso. Presente na Xbox Live, PSN e no Steam, o game de plataforma chamou a atenção de críticos de todo o mundo graças aos seus gráficos monocromáticos e à atmosfera de terror, uma clara referência ao cinema expressionista alemão deNosferatu. O jogo conta a história de um garoto que se aventura em um cenário macabro - o limbo - para encontrar a sua irmã perdida. A solidão é inerente à trama, que em nenhum momento conta com o suporte de trilha sonora, efeitos de áudio ou dicas; o jogador encara sozinho, e no escuro, todos os desafios propostos pelo título dinamarquês. O processo de desenvolvimento de Limbo demandou quatro anos de trabalho e a repercussão acerca de sua proposta fez com que a revista The Atlantic lhe dedicasse um artigo. "Não se trata de um jogo sobre a morte, mas sobre a vida. Ao contrário de qualquer outra forma de expressão, aprendemos sobre o jogo vivendo-o", diz o texto. Outra inspiração para a produção foi a estética dos filmes noir - estilo cinematográfico caracterizados pelo alto contraste -, conforme afirma  Arnt Jensen, diretor do game. Em novembro de 2011, o estúdio Playdead anunciou a marca de 1 milhão de downloads em todas as três plataformas nas quais está disponível (PC, PS3 e Xbox 360). 

Preço: R$ 30,99


Não há números oficiais acerca do faturamento do setor de indie games, mas, segundo a empresa de consultoria Price Water House Coopers, a indústria como um todo deve faturar, em 2014, cerca de 86 bilhões de dólares. Como grande parte dos estúdios de desenvolvimento é independente, a expectativa é que o crescimento seja muito favorável para a fatia alternativa do mercado nos próximos dois anos. 
De acordo com Richard Wilson, presidente da associação comercial da indústria de games na Grã-Bretanha (Tiga, em inglês), há na região 329 estúdios de desenvolvimento, a maioria independentes. Já nos Estados Unidos, mais de 600 estúdios apostam no circuito indie. São esses profissionais, explica Wilson, os responsáveis por popularizar importantes tendências e, consequentemente, renovar o mercado. "Tradicionalmente, os jogos sempre foram desenvolvidos para consoles. Nos últimos anos, contudo, muitos títulos foram produzidos para celulares, smartphones, tablets e browsers. Esse movimento fez com que ocorresse um 'boom' no número de jogos sociais, na quantidade de games adaptados para navegadores, na popularização dos títulos on-line e no surgimento de jogos casuais para PC, que visam atender uma parcela da população ainda pouca familiarizada com os games tradicionais", diz o executivo. 
Para Wilson, há ainda outra razão para o setor independente estar vivenciando crescimento. "O custo do desenvolvimento de jogos caiu muito nos últimos anos. Um game para celular ou tablet, por exemplo, pode ser desenvolvido por 200.000 libras, já um jogo para console vai exigir um investimento de, aproximadamente, 15 milhões", afirma. 
No Brasil, essa ebulição criativa na área de desenvolvimento de jogos também é notável. De norte ao sul do país, programadores e designers se reúnem para criar títulos capazes de levar para o exterior um pouco da cultura local, sempre alheia ao mercado global de entretenimento eletrônico. No último Simpósio Brasileiro de Games (SBGames), realizado em novembro de 2011, o grande destaque foi Xilu (confira na lista acima), um jogo produzido por uma equipe da Paraíba e inspirado na xilografia, na literatura de cordel e no baião. Já no IGF, o mais importante festival de jogos independentes do mundo, foi o brasileiríssimo Toren que recebeu menção honrosa. O título, que segue em desenvolvimento no Rio Grande do Sul, é alvo de investidores americanos e recebeu propostas de distribuidores internacionais.
fonte:http://veja.abril.com.br
Postagem Anterior
Proxima Postagens

Postado Por:

0 comentários: