Quem vê de longe pode jurar que aqueles olhos vidrados no computador estão sem piscar para não perder nenhum movimento do jogo de tiro ou de RPG da moda entre adolescentes. Na verdade, é quase isso
. O game que tem prendido a atenção de jovens de escolas públicas do país até é cheio de aventuras, fases e desafios, mas seu objetivo não é a diversão pura e simples. É, antes de tudo, promover uma “aprendizagem periférica” das disciplinas tradicionais do currículo. Lançada em 2008, a OJE, Olimpíada de Jogos Digitais e Educação, já envolveu 100 mil estudantes de Acre, Rio e Pernambuco e o prognóstico é que ela chegue a 2 milhões de jovens até 2015.
“Nós usamos a mecânica clássica dos jogos. Não é um jogo educativo em que o menino está atento e, de repente, a gente para para dizer ‘aqui é uma mitocôndria’. Isso atrapalha a experiência de imersão”, diz Luciano Meira, professor de psicologia da UFPE e que participa do desenvolvimento dos games. Segundo o especialista, a proposta da OJE é aproximar a realidade das escolas dos ambientes dos jogos de diversão, que fazem parte da vida dos estudantes, mas não são bem recebidos em sala de aula.
crédito Don Andreas / Fotolia.com
Há quatro anos, conta Meira, quando o projeto começou, a equipe fez uma busca sobre as outras olimpíadas de conhecimento que já havia no Brasil. Tomaram como exemplo a Olimpíada de Matemática. “Ela é um fenômeno, tem 20 milhões de inscritos. O problema é que ela perde 19,9 milhões já na primeira fase. E nós não queríamos isso. Queríamos uma olimpíada de aprendizagem.”
Eles resolveram, então, desenvolver uma olimpíada que durasse todo o ano e que a pontuação acumulada das equipes as levassem para a etapa final. Assim, ao longo do ano letivo, o aluno pode participar individualmente para fortalecer seu avatar – comprando roupas e acessórios que o ajude nos desafios – e em equipes multisseriais. “No ensino médio, temos equipes com alunos do primeiro, do segundo e do terceiro ano. Eles gostam porque têm assuntos que o menino do terceiro ano não lembra mais, enquanto têm outros que o do primeiro ainda não aprendeu”, afirma Meira.
“Eles ficam se policiando para não errar. Dizem uns para os outros: ‘se tiver alguma dúvida, pergunta que nós ajudamos. Só não trava o jogo’.”
Na plataforma, os alunos têm acesso a aventuras complexas a serem jogadas em equipe; minijogos, que duram cerca de 15 minutos e têm enigmas inspirados no Enem; wikigames, em que ele deve completar verbetes relacionados ao que vem aprendendo; e até jogos de realidade alternativa, conhecidos por ARGs, em que os desafios misturam tarefas presenciais e virtuais. No fim do ano, as equipes com melhor desempenho participam da final da olimpíada. “Nesse dia, cortamos a internet. Os meninos levam malas de livros para consultar e responder aos desafios”, diz.
A ferramenta funciona também como uma rede social gamificada. Como cada aluno tem seu avatar, ele consegue interagir com alunos e professores de todo o estado, para trocar experiências e até “provocar rivalidades positivas”. Em dado momento, se um dos membros da equipe erra algum desafio, o jogo fica travado para todos membros por um período em que ninguém pode jogar e somar pontos. “Eles ficam se policiando para não errar. Dizem uns para os outros: ‘se tiver alguma dúvida, pergunta que nós ajudamos. Só não trava o jogo’.” Essa cultura da conversa e do diálogo, diz Meira, é uma das formas de aprendizado que se reforça com a OJE. “Nós não chamamos de jogos educativos, mas de jogos conversacionais.” Sem dar valores, Meira diz que o custo por aluno para que secretarias estaduais de educação usem a ferramenta é “baixíssimo”.
Ainda de acordo com Meira, o envolvimento das escolas com a olimpíada tem trazido efeitos positivos claros: aumento da frequência na biblioteca, do engajamento dos estudantes e aproximação entre alunos e professores, no número de horas que o laboratório de informática fica aberto.
Confira, a seguir, vídeo em que Luciano Meira explica a OJE.
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